Árvore genealógica de Simão Carneiro de Mendonça


avós
paternos
Antônio Carneiro de Mendonça + Escolástica Benedicta Soares de Camargos
PAI
Sebastião Carneiro de Mendonça (Luziânia, Go)
avós
maternos
Joaquim Alves de Mendonça + Anna Gonçalves Soares
MÃE
Florentina Alves de Mendonça

IRMÃO(s)
Simão Carneiro de Mendonça
1909

Simão Carneiro de Mendonça
05-01-1909
 † bef 2005
(idade: 96 anos)
 
CÔNJUGE(s)
Belkiss Ornisi Spenzieri
15-02-1928
 †  17-11-2005 - Goiânia (GO) (Brasil)

FILHO(s) de Simão Carneiro de Mendonça e Belkiss Ornisi Spenzieri

   NOTAS


- Genealogia Luziana, Gelmires Reis, Santa Luiza, Planalto central da República, Estado de Goiás, 1929 - p. 55 e p. 65

 

Foi Secretário de Saúde de Goiás.

 

Simão Carneiro de Mendonça

O médico que calculava

 

O corpo de Simão Carneiro de Mendonça ia baixando à sepultura em 21 de fevereiro de 1983. O silêncio imperava no ambiente. Quem tinha de chorar o fazia baixinho, um sussurro virava um grito. Sério, compenetrado, tido por alguns como sisudo e de poucas palavras, o médico que os familiares e amigos viam pela última vez fora um verdadeiro herói dos primeiros tempos de Goiânia, onde chegou no início de 1938 para trabalhar na recém-fundada Santa Casa.

Quando as primeiras pás de terras eram jogadas sobre o caixão, o coveiro interrompeu o consternado silêncio gritando:

— Gente, esse homem não podia ter morrido. Ele era um santo.

Todos se viraram para aquela figura humilde que, com a pá na mão, parecia o mais desconsolado dos presentes:

— Se estou aqui hoje devo a esse homem. Eu estava chorando na porta da Santa Casa e ele me atendeu. Ele não pode morrer. Se ainda fico de pé devo a ele que, quando mandaram amputar minha perna e contra todas os diagnósticos, insistiu em me operar e hoje estou bom.

E sem dar espaço para a comoção geral, levantou a barra da calça puída onde se via uma cicatriz que ia do calcanhar ao joelho.

 

Vindo para Goiânia de Luziânia, sua cidade natal, onde possuía um pequeno hospital, Simão Carneiro de Mendonça doou para a Santa Casa o instrumental médico necessário para o centro de cirurgia.

Nascido em 5 de janeiro de 1909, Simão cursou medicina na Universidade de Minas Gerais, diplomando-se em 1934. Escrevia e falava fluentemente alemão, francês e inglês. Sério e de poucas palavras, era doce no convívio, podia facilmente ser confundido com uma pessoa severa. Seu tipo físico ajudava. Cara quadrada, olhar firme e direto, ombros largos, lutador de boxe, fundador da federação goiana do esporte. Tinha o nariz achatado pelas lutas e as orelhas endurecidas de tanto levar pancada.

Chegou à capital em 1938 para atender como obstetra, ginecologista e cirurgião geral, montando um consultório em Campinas. Era a fase das velas e lamparinas, quando a energia elétrica parecia obedecer estranhos e insondáveis desígnios de sabe-se lá quem. Simão Carneiro de Mendonça sempre tinha em casa um estoque de lampiões das marcas Petromax e Aladim, e boas lanternas a pilha, já que frequentemente tinha de sair à noite pelas escuras ruas da cidade para atender algum paciente. Simão conhecia todos os buracos das ruas. Aproveitava a lanterna que iluminava o caminho e a usava na operação que não podia esperar. Se fosse só a falta de luz seria um dia bom. Complicado mesmo ficava quando ele realizava até 14 cirurgias em um dia, entre grandes e pequenas. Em ocasiões extremas chegou a extrair dentes inclusos.

Simão foi secretário de Educação e Saúde (a secretaria só seria desmembrada na década de 50) mas não deixava de atender gratuitamente. A maioria dos pacientes não tinha condições de pagar. Sua carga horária ia além do absurdo, simplesmente não terminava nunca. Era chamado várias vezes na madrugada. Não conhecia final de semana ou feriado. Em alguns domingos não voltava para casa que, não por coincidência, no final da década de 40 era em frente à Santa Casa. De sua residência, muito grande à época e onde em 2005 mora sua viúva, a pianista Belkiss Spenzieri Carneiro de Mendonça, ouvia os gritos dos doentes no hospital em frente. Ato contínuo, colocava a roupa para atender. A movimentação da Santa Casa transformava-se em senha para o trabalho e toda a vida (até sua casa) girava em torno do primeiro hospital de Goiânia.

Sono era uma palavra sem importância no seu dicionário e que ele não pensava em repor. Pelo contrário, apesar de dormir pouco, reclamava:

— Se eu não tivesse sono podia estudar muitas horas mais.

Sua memória era prodigiosa. Só no final da vida foi ter fichário. Lembrava-se com exatidão não só que tipo de atendimento tinha dado, como a cidade de onde o paciente viera. Tudo de memória. Só no final da vida sua mulher organizou uma ficha de seus pacientes.

Na década de 60 tirou suas primeiras férias. Foi a única de sua vida e por um motivo hoje inacreditável: conhecer o asfalto que ligava Goiás aos grandes centros. Simão carregou a família, colocou no carro e saiu sem rumo seguindo as novas estradas construídas com o surgimento de Brasília. Enfrentou mais buraco do que asfalto, como no Triângulo Mineiro. Viu estrada tomada pelo mato, estrada alagada, estrada que não existia. Pensou chegar a Belo Horizonte mas acabou em São Paulo.

Matemática era o hobby de Simão, o que prova sua biblioteca e seu escritório em casa, mantidos intactos pela família. Não desgrudava dos livros e vivia às voltas com os teoremas. Seu cotidiano dividia-se entre a medicina e a geometria, trigonometria, cálculos integrais e vetoriais. Não gostava de festas, mas acompanhava a mulher sem reclamar, embora pudesse ficar horas sentado sozinho, com o olhar parado e distante, sem dar uma palavra, maquinando contas na cabeça. Foi convidado a se candidatar a governador (seu avô era chefe político em Luziânia), mas preferiu ficar com os números e o bisturi.

Mais tarde, quando descobriu a lógica, Simão entusiasmou-se, dizendo a todos:

— Isso que eu queria.

Só havia um problema: ninguém em Goiás estudava lógica. Conseguir livros era uma dificuldade, minorada pelos amigos que lhe traziam alguns exemplares da Europa. Estudando sozinho, muitas vezes enguiçava anos num determinado teorema sem ninguém para discutir. Estudava em todos os momentos livres e a família morria de pena. Lecionou a matéria na Universidade Federal de Goiás, a princípio sem salário. Tanto pesquisou, tanta conta fez que desenvolveu uma técnica chamada lógica do diagnóstico. No emaranhado de equações matemáticas ele conseguia enxergar um modo de auxiliar a medicina. O trabalho poderia ser uma revolução ou dar em nada. Só que nunca se saberá, pois Simão morreu antes de completar a obra.

 

Médicos e Medicina em Goiás

Autor

Iúri Rincon Godinho

Editora

Contato Comunicação/Editora da UCG

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